A confirmação de Morte Encefálica pode ser realizada pela Medicina Nuclear? | IMEB

A confirmação de Morte Encefálica pode ser realizada pela Medicina Nuclear?

Resultado de imagem para morte encefálica

A morte encefálica foi descrita pela primeira vez em 1959 por Mollaret e Goulon. É definida como a perda total e irreversível das funções hemisféricas cerebrais e do tronco cerebral.

Os parâmetros clínicos a serem observados para a constatação da morte encefálica são: coma aperceptivo com ausência de atividade motora supra-espinal e apnéia.

Um dos pontos principais na avaliação de morte encefálica é a doação de órgãos para transplante, sendo que o Conselho Federal de Medicina através da Resolução CFM nº 1480/97 de 08/08/97, determina a realização de exames complementares para a confirmação de morte encefálica, que deverão demonstrar de forma inequívoca:

a) ausência de atividade elétrica cerebral ou,

b) ausência de atividade metabólica cerebral ou,

c) ausência de perfusão sanguinea cerebral.

A mesma resolução cita como os possíveis métodos complementares pela medicina nuclear a cintilografia radioisotópica, a tomografia por emissão de fóton único e a tomografia por emissão de pósitrons, uma vez que esses métodos são capazes de demonstrar através do estudo de PET com FDG-18F a ausência de metabolismo glicolítico encefálico, e através da angiografia radioisotópica e o estudo de perfusão cerebral (SPECT com traçadores de fluxo sanguineo) a ausência de perfusão cerebral.

Nos casos de morte encefálica comprovados pela angiografia cerebral, o fluxo do contraste iodado pára na base do crânio e a circulação intracraniana não é visualizada. Em 1969 já foi demonstrado que a medicina nuclear também poderia documentar a ausência do fluxo sanguíneo cerebral em casos de morte encefálica através da angiografia radioisotópica, técnica não invasiva realizada após a administração intravenosa de material radioativo, sendo proposto um estudo dinâmico do fluxo sanguíneo adquirido através da administração intravenosa de DTPA (ácido dietileno triamino pentaacético), GH (gluco-heptonato), soro albumina humana marcados com tecnécio-99m e o próprio tecnécio-99m na forma de pertecnetato-99mTc (num volume limitado de 0,3 ml associado com solução de “flush” de 10ml de solução fisiológica para assegurar um bom “bolus” de injeção, sendo adquiridas imagens dinâmicas seqüências a cada 3 segundos durante o primeiro minuto de estudo, na projeção anterior da cabeça, para avaliação do fluxo sangüíneo cerebral (circulação cerebral) e posteriormente, imagens estáticas nas projeções lateral e posterior da cabeça após esse primeiro minuto de estudo para a avaliação do preenchimento do seio sagital.

O achado cintilográfico na morte encefálica através do estudo de angiografia radioisotópica é a ausência de fluxo sanguíneo cerebral. Quando ocorre a morte encefálica e a vida é artificialmente mantida, o cérebro como um todo se apresenta necrótico e liquefeito na autópsia, decorrente da interrupção da circulação cerebral devido ao aumento da pressão intracraniana e alterações na circulação microvascular do cérebro. Na angiografia radioisotópica, o “bolus” do material radioativo pára na base do crânio e a circulação intracraniana não é visualizada, assim como o seio sagital superior também não é visualizado.

Recentemente, agentes cerebrais perfusionais: HMPAO-99mTc (hexametilpropileno-amina oxima marcado com tecnécio-99m), anfetamina-123I (anfetamina marcada com iodo-123) e ECD-99mTc (dímero de etil cisteinato marcado com tecnécio-99m) que atravessam a barreira hematoencefálica têm sido recomendados ao invés dos agentes traçadores do “pool sanguíneo”, como o DTPA-99mTc, pertecnetato-99mTc, GH-99mTc, soro albumina humana-99mTc. Os agentes cerebrais perfusionais são concentrados e permanecem dentro das células cerebrais por horas e os estudos para confirmação de morte encefálica são mais fáceis de serem interpretados e dependem menos da técnica de imagem em relação aos traçadores do “pool sanguineo”. Um “bolus” sub ótimo ou uma má funcionalidade temporária do equipamento durante a administração intravenosa do traçador não impede a interpretação.

A relativa baixa resolução espacial que pode causar certos problemas na interpretação da angiografia radioisotópica não é problema quando se utilizam traçadores específicos cerebrais, devido ao extremo alto contraste do cérebro normalmente perfundido com as demais regiões da cabeça, como por exemplo, o couro cabeludo.

Imagens estáticas podem ser realizadas em mais de um plano e teoricamente podem detectar menor grau de fluxo sanguíneo cerebral em relação aos agentes do “pool sanguineo”, porque eles são captados pelo tecido cerebral viável. A distribuição regional inicial é dependente do fluxo e cerca de 7% da dose de HMPAO-99mTc injetado em veia periférica é concentrado em tecido cerebral normal dentro de 1 minuto, também o ECD-99mTc apresenta alta extração de primeira passagem devido a sua lipofilicidade. Ao contrário, com a morte disseminada neuronal, a captação desses agentes cerebrais perfusionais é ausente mesmo quando uma pressão de perfusão cerebral artefatual é mantida. A imagem do crânio vazio (hollow skull” ou “empty skull”) é observada tanto na imagem plana quanto na imagem tomográfica (SPECT – “Single Photon Emission Computed Tomography”) nos pacientes em morte encefálica que foi analisada com radiotraçador de perfusão cerebral. Normalmente, realizam-se imagens nas projeções anterior, posterior e laterais da cabeça para avaliação de todo o encéfalo, incluindo fossa posterior e tronco cerebral.

Também em crianças, inclusive nas menores de dois meses de idade, a avaliação para confirmação de morte encefálica através de cintilografia cerebral com agentes traçadores de perfusão cerebral tem provado a sua utilidade, além da sua simplicidade de execução, custo e não invasividade.

Aquisições tomográficas também podem ser realizadas com esses agentes (SPECT) para confirmar o diagnóstico de morte encefálica. Esse tipo de aquisição de imagens tomográficas permite informação regional mais precisa, incluindo a análise da preservação ou não do fluxo sanguineo na fossa posterior e no tronco cerebral, que em muitas situações não foi observada através do estudo de angiografia radioisotópica, normalmente realizado na projeção anterior da cabeça. Em algumas situações, mesmo com as imagens laterais da cabeça, as partes moles da região dorsal do pescoço podem se tornar indistinguíveis do cerebelo e do tronco cerebral, situação em que as imagens tomográficas (SPECT) podem auxiliar na interpretação.

Leia também: Mitos e Verdades sobre Medicina Nuclear: o que você precisa saber.

Dra. Carla Rachel Ono
Médica Nuclear
Centro de Medicina Nuclear do HCFMUSP
São Paulo-SP

Por: Dr. Renato Barra / Categoria: Destaque Notícias

7 de novembro de 2016

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