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Por: Dr. Renato Barra

Cresce a mortalidade por câncer no país

Caso nenhuma medida seja tomada, calcula-se que até 2030 as neoplasias serão a primeira causa de óbito entre os brasileiros.

O câncer já é a principal causa de morte em 10% dos municípios brasileiros, superando as doenças cardiovasculares – atualmente líderes em mortalidade. Se nada for feito para mudar ou estabilizar essa curva, calcula-se que até 2030 as neoplasias serão a primeira causa de morte no país, sendo o envelhecimento da população uma das causas. A constatação é de levantamento inédito realizado pelo Observatório de Oncologia, ferramenta do movimento Todos Juntos Contra o Câncer (TJCC), em parceria com o Conselho Federal de Medicina (CFM).

Os dados se referem ao ano de 2015 e levam em consideração os números mais recentes disponíveis no Sistema de Informações de Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde. Os pesquisadores cruzaram as informações dos 5.570 municípios brasileiros e chegaram nas 516 cidades onde o câncer é a principal causa de óbito. Os resultados foram apresentados hoje durante a terceira edição do Fórum Big Data em Oncologia, em Brasília, onde serão discutidos os impactos disso especialmente na saúde pública.

Um dos dados que chamam a atenção é que 80% das cidades onde o câncer é a principal causa de morte estão concentradas nas regiões Sul e Sudeste, justamente as mais desenvolvidas do Brasil, onde a expectativa de vida é maior e onde o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é mais alto. O Nordeste soma 9% desses municípios; seguido do Centro-Oeste (7%) e do Norte (4%).

Segundo os pesquisadores, ao todo essas cidades somam 6,6 milhões de habitantes, mas apenas 11 são considerados de grande porte (acima de 100 mil habitantes), sendo Caxias do Sul (RS) a cidade mais populosa. Outros 27 municípios são de médio porte (com população entre 25 mil e 100 mil), sendo a maioria pequenas cidadezinhas com menos de 25 mil habitantes (Veja tabela).

O Rio Grande do Sul, inclusive, é o Estado com o maior número de cidades onde o câncer é a primeira causa de morte: ao todo são 140 municípios, o que representa 27% do total.

Segundo Ana Cristina Pinho, diretora geral do Instituto Nacional de Câncer (Inca), braço do Ministério da Saúde, esses números podem ser explicados da seguinte maneira: o Rio Grande do Sul é uma região bastante desenvolvida e a tendência é que as pessoas vivam mais. Assim, a incidência de câncer aumenta, pois a doença está relacionada ao envelhecimento da população.

Outros fatores que explicam esses dados, diz Ana Cristina, são as características genéticas da população do sul, aliadas à questões como alimentação e fatores de risco. “É sabido que no Sul há mais casos de câncer de pele não melanoma porque as pessoas têm a pele muito clara. Também há mais casos de câncer de intestino por causa do alto consumo de carne vermelha”, diz. O subdiagnóstico da doença em regiões menos desenvolvidas também acaba se tornando um fator importante na leitura dos dados. “O nosso grande gargalo ainda é fazer o diagnóstico precoce do câncer, especialmente nas cidades do Norte e do Nordeste. São locais com menos assistência de nível primário. Muitas pessoas morrem sem ao menos terem sido diagnosticadas com a doença”, avalia a diretora do Inca.

Ainda segundo a pesquisa, das 9.865 mortes registradas em 2015 nessas 516 cidades, a maioria foi entre homens (57%), sendo que apenas no Ceará e no Mato Grosso a mortalidade entre mulheres foi maior. Com relação à idade, metade dos óbitos se concentra na faixas entre 60 a 79 anos. Crianças e adolescentes, faixa que compreende de zero a 19 anos, somaram 1,3%  das mortes naquele ano.

Transição epidemiológica

Em 2015, o Brasil registrou 209.780 mortes por câncer e 349.642 relacionadas a doenças cardiovasculares e do aparelho circulatório. Ao cruzar esses números com os de 1998 – quase 20 anos atrás –, observa-se um aumento considerável na mortalidade por neoplasias: 90% de aumento em relação a 1998, quando 110.799 pessoas morreram da doença. Ao mesmo tempo, houve uma alta de apenas 36% na mortalidade por doenças cardiovasculares (saltando de 256.511 em 1998 para 349.642 em 2015), demonstrando que as mortes por câncer evoluíram três vezes mais rápido.

“Esses dados demonstram que o câncer está passando por uma transição epidemiológica. O Brasil terá de se planejar com políticas específicas de atenção oncológica, principalmente na rede de atenção primária. As doenças cardiovasculares foram e ainda são objeto de muito cuidado dentro da indústria farmacêutica e nos sistemas de saúde. Está chegando o momento de o olhar focar no câncer”, avalia Ana Cristina, do Inca.

Hermann von Tiesenhausen, primeiro secretário do CFM, concorda com Ana Cristina e diz que tendo um mapeamento adequado, feito por região e por tipo de câncer mais prevalente, é possível investir em centros especializados nesses tipos de tumor. “Esses dados nos permitem entender melhor onde está o câncer e o tipo de câncer em cada região do pais, o que permite direcionamento de recursos para serviços específicos”, sugere.

Para Merula Steagall, coordenadora do movimento Todos Juntos Contra o Câncer e presidente da Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale), a expectativa é justamente a de que o estudo contribua para um melhor planejamento de ações de controle e de tratamento da doença no Brasil. “O aumento da mortalidade por câncer está relacionado, também, às dificuldades enfrentadas pelo paciente para ter um diagnóstico precoce e um tratamento adequado”, diz. Ela pede mais atenção às políticas de combate à doença. “Diversos tipos de câncer são preveníveis e outros têm seu risco de morte significativamente reduzido quando diagnosticado precocemente. Nosso objetivo é alertar”, destacou.

Thiago Cepas Lobo, um dos pesquisadores responsáveis pelo levantamento, afirmou que os municípios que tiverem interesse em detalhar os dados podem entrar em contato com o Observatório da Oncologia. “Será possível saber quais os tipos de câncer foram os que mais causaram mortes naquela cidade, quais idades mais atingidas, o sexo, a prevalência, entre outros dados. Assim, será possível auxiliar o gestor a entender o que acontece na sua cidade para poder tomar medidas específicas”, finalizou.

Cidades em que o câncer mata mais do que doenças do coração (em 2015)

Até 2030 as neoplasias devem ser a principal causa de morte no país

MunicípioÓbitos por câncerTaxa de mortalidade*
Caxias do Sul (RS)66914,09
Piracicaba (SP)52813,49
Blumenau (SC)44713,19
Montes Claros (MG)3839,71
Passo Fundo (RS)31516,01
Foz do Iguaçu (PR)30911,71
Jaraguá do Sul (SC)18611,36
Bento Gonçalves (RS)16914,92
Cambé (PR)14714,16
Araucária (PR)14410,79
São Gabriel (RS)14122,46
Erechim (RS)14013,68
Lajeado (RS)12916,44
Concórdia (SC)10113,90
Jaguariúna (SP)7314,06
Presidente Venceslau (SP)7118,02
Guaíra (SP)6516,33
Medianeira (PR)6514,48
Xanxerê (SC)6513,44
São José do Norte (RS)6323,35
Charqueadas (RS)6316,46
Portão (RS)6218,24
Estância Velha (RS)6113,13
São Miguel do Oeste (SC)5814,88
Curitibanos (SC)5814,78
Marau (RS)5613,94
Encruzilhada do Sul (RS)5521,38
Lagoa Vermelha (RS)5519,35
Veranópolis (RS)5020,25
Brumadinho (MG)4511,89
Fraiburgo (SC)4211,69
Nova Prata (RS)4116,36
Pompéu (MG)4113,15
Ilha Solteira (SP)4015,18
Mandaguaçu (PR)3817,53
São Lourenço do Oeste (SC)3816,35
Guaramirim (SC)389,30
Tibagi (PR)3718,16
Júlio de Castilhos (RS)3617,95
Xaxim (SC)3512,67
Nova Santa Rita (RS)3312,84
Tupi Paulista (SP)3221,12
Borda da Mata (MG)3217,13
Ampére (PR)3116,67
Seara (SC)3017,20
Luz (MG)3016,40
Cambuci (RJ)2919,55
Guaraniaçu (PR)2820,00
Sarzedo (MG)289,37
São João Batista (SC)288,56
* Taxa de mortalidade por câncer para 10.000 habitantes
FONTE:https://veja.abril.com.br/saude/cresce-a-mortalidade-por-cancer-no-pais/

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